O lixo que flutua no espaço coloca em risco a navegação orbital de satélites e astronautas. Mas há maneiras de reduzir o perigo, apontam pesquisadores suíços que desde 2012 estudam maneiras de retirar resíduos do espaço.
15 de novembro de 2021. Silenciosamente, 480 quilômetros acima da vasta estepe russa, o satélite Kosmos-1408 explodiu deixando uma fumaça de detritos de todos os tamanhos. Aposentado há quase 40 anos, o satélite havia sido atingido por um míssil antibalístico A-235 disparado do cosmódromo de Plesetsk.
O local da explosão, a 480 quilômetros do território russo, era perigosamente perto da órbita da Estação Espacial Internacional (ISS). Logo após o estouro, os sete tripulantes que estavam na estação espacial foram imediatamente orientados a vestir seus trajes especiais e se refugiarem nas cápsulas de emergência que lhes permitiriam retornar à Terra caso ocorresse alguma colisão com os detritos do satélite.
O Pentágono denunciou a explosão como um ato "inconsequente e perigoso", mas Moscou respondeu que tudo tinha sido feito de acordo com as normas de segurança. Especialmente porque há dois cosmonautas russos a bordo da ISS - um dos quais é o comandante.
Colisões de todos os tipos
Provocar explosões espaciais não é uma novidade. A China, os Estados Unidos e a Índia já se envolveram neste tipo de demonstração de força, destruindo seus próprios satélites entre 2007 e 2019.
Mas há também colisões acidentais. Em 22 de março de 2021, o satélite meteorológico chinês Yunhai 1-02 colidiu com um pedaço do foguete russo Zenit-2, lançado nos anos 90. O acidente foi a pior colisão orbital confirmada desde fevereiro de 2009, quando o satélite russo (também militar) Kosmos-2251 colidiu com o satélite de comunicações norte-americano Iridium 33.
Cada um desses eventos, intencionais ou não, aumenta em algumas centenas a quantidade de detritos que congestionam a baixa órbita terrestre - localizada em até 2000 km de altitude. Atualmente, existem 34 000 pedaços de detritos, contando apenas aqueles que os radares terrestres são capazes de detectar. Há também quase 130 milhões de pequenos objetos de detritos, que giram 20 vezes mais rápido do que uma bala de arma de fogo e são capazes de causar grandes danos.
Alertas piscando
Hoje, agências espaciais, lançadores privados de satélites e a academia estão muito conscientes do problema. Na Escola Politécnica Federal de Lausanne (EPFL), pesquisadores estão lidando com a questão desde pelo menos 2012, quando nasceu o projeto ClearSpace com objetivo de construir o primeiro satélite de coleta de lixo.
Mas os tomadores de decisão ainda não estão totalmente convencidos da utilidade de investir em soluções de limpeza para resíduos espaciais. Na EPFL, Marie-Valentine Florin, diretora do International Risk Governance Center (IRGC), aponta que não há um estudo comparativo das diferentes soluções e dos custos envolvidos. A tarefa de conduzir este estudo será confiada a Romain Buchs, um jovem físico que acaba de concluir sua tese de mestrado sobre a gestão de detritos espaciais. Um primeiro relatório será publicado na primavera de 2021, com a previsão de ser lançado para os políticos e a indústria em novembro.
"Entrevistamos de forma dirigida cerca de 400 pessoas de agências espaciais e do setor privado", explica o autor. Mas Buchs admite que é "difícil alcançar os chineses e os russos" e que os funcionários desses países não estão na lista.
“Normalmente os satélites devem reentrar na atmosfera [e, portanto, explodir] no máximo 25 anos após o fim de sua vida operacional" diz o pesquisador. Mas a regra não é vinculativa e, portanto, não é suficientemente aplicada. Cerca de 60% dos satélites a cumprem, mas o ideal seria que pelo menos 90% dos equipamentos fossem desintegrados segundo a normativa.
Pesos leves versus pesos pesados
A questão é: há cada vez mais satélites. Nos últimos anos, o monopólio do acesso ao espaço foi dissolvido entre as nações. E a tendência é que a constelação de instrumentos circulando na baixa órbita cresça cada vez mais. Esse fluxo, que começou no final do século 20 com Iridium e Globalstar e seus satélites para telefones, hoje mudou muito.
Com OneWeb, depois Starlink (SpaceX) e Kuiper (Amazon), o número de satélites aumentou de centenas para milhares, com o pretexto de supostamente trazer Internet rápida para todo o mundo. Seus operadores nos garantem que estão tomando todas as precauções necessárias, seja voando baixo o suficiente para que a desorbitação ocorra automaticamente após alguns anos ou equipando suas embarcações com dispositivos para facilitar a captura por futuros rebocadores espaciais.
Para Romain Buchs, os enxames de pequenos satélites não são realmente o problema. "Basicamente, são as nações que criaram o problema. As novas constelações de satélites são, antes de tudo, vítimas. Os instrumentos que circulam na baixa órbita são pequenos satélites, que não pesam mais do que 150 quilos. Os problemas reais vêm de pedaços inteiros de foguetes - especialmente os russos - que podem pesar até nove toneladas e foram lançados entre 1980 e 2005", diz o especialista.
Gerenciando o caos
Entretanto, Romain Buchs não acredita em cenários apocalípticos, como a Síndrome de Kessler, que sugere no futuro o espaço estará tão congestionado que todo voo se tornaria impossível.
"Nunca conseguiremos captar os detritos menores, então, nos concentraremos nos maiores, que podem colidir e criar milhares de peças pequenas adicionais". Há cerca de 2.000 deles em baixa órbita.
Segundo o físico, procurar três ou quatro resíduos grandes por ano e fazer o “descarte” apropriado deles seria suficiente para reduzir consideravelmente o risco. E este é o objetivo do projeto ClearSpace, que nasceu na EPFL e agora integra a Agência Espacial Europeia (ESA). Os japoneses também têm um projeto semelhante (Astroscale). E surgirão outros.
O argumento de que “para diminuir resíduos basta parar de lançar satélites em órbita” esquece o quanto nosso mundo depende dos satélites. "Para tomar apenas um exemplo, 26 dos 55 parâmetros usados para medir a mudança climática só podem ser medidos a partir do espaço", diz Romain Buchs.
Fonte: Swissinfo
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